O italiano Cristiano Savini é bonitão, simpático, viajado, veste-se bem e adora um papo. Poderia ser um homem comum de 31 anos se não fosse sua profissão: não é empresário, advogado, publicitário nem enólogo. Cristiano é caçador de trufas brancas. O melhor do mundo, aliás. Além disso, é proprietário da Savini Tartufi que lida, obviamente, com trufas.
Tive o prazer de almoçar com ele e entrevistá-lo no Tre Bicchieri , seu cliente, assim como o El Bulli e dezenas de grandes restaurantes pelo mundo. Durante nossas duas horas de conversa, tomamos bastante vinho, falamos pacas e degustamos dois pratos sensacionais com muuuuuuita trufa branca ralada na hora (por ele): carpaccio com parmegiano-reggiano e ravioloni de gema com pecorino. Não pesei, mas deve rolar cerca de 25 ou 30 gramas de trufa branca por prato.
Incrível como a trufa branca não lembra em nada o aroma extremamente gaseificado da negra. É delicada, saborosa, sutil e cresce ainda mais combinada com uma boa massa ou pão, ovo e carne. Bom, abaixo estão os momentos mais bacanas da entrevista com Cristiano– a quarta geração dos Savini no negócio. Ele ficaria só mais um dia no Brasil porque participaria de um leilão da trufa que havia encontrado há três dias: com 850 gramas, pode chegar a valer mais de 100 mil dólares! Só perde para a de 1,497 kg encontrada por ele em 2007, que alcançou o preço de … 330 mil dólares. O comprador foi o bilionário chinês Stanley Ho que deve ter comido trufa ralada até em cima do tofu.
• Temporada
“O tartufo nasce de uma conjunção muito especial do solo, de típicos específicos de árvores com as quais cria simbiose e dos esporos presentes no ar. É impossível “criar” trufas– esses fungos são uma consequência do ecossistema presente na Toscana e em Alba, no Piemonte. Porém, por a Toscana ter o solo livre de qualquer resíduo industrial e não ter nenhuma poluição, nossas trufas são mais puras, mais saborosas. A temporada vai de meio de setembro a final de dezembro”
• Produção
“Em 2011 colhemos cerca de 20 kg por semana. Este ano, sabe-se lá porquê, a produção está sendo de 45 kg por semana, em média. Mas nunca sabemos o que nos espera na próxima temporada”
• Mercado
“O EUA é o maior comprado do mundo, hoje. Muito importantes também são a China, a Alemanha e a Itália, claro. Minha exportação para o Brasil também vem crescendo.”
• Segredos da caça
“Tudo é passado de geração para geração. Eu sei em quais árvores encontrar trufas, quais são as que produzem as maiores, os dias que tenho que caçar e os dias que devo ficar em casa, tudo, por causa das anotações do meu bisavó, do meu avó, do meu pai. Os cadernos de um caçador de trufas são seu maior tesouro porque são a verdadeira bússola– a área produtora é livre, qualquer um pode entrar e pegar a trufa. Mas não é qualquer um que sabe onde fazer isso… Quando morre um caçador que não tem herdeiros, os parentes enterram o diário com ele.”
• O que comer com o ingrediente
“Sou um péssimo cozinheiro… (risos). Ainda bem que a trufa branca combina bem com ingredientes mais básicos, sem grande elaboração e que não roubem o aroma e o sabor dela: batata, pasta, arroz, ovo, parmesão. O que adoro fazer em casa é bruschetta regada com bom azeite de oliva, raspas de trufa branca e flor de sal.”
• Duração
“A trufa branca é muito delicada: dura cerca de onze dias depois de retirada do solo. Para melhorar seu aproveitamento, começamos a fazer outros produtos com ela, como o azeite, manteiga, mel e patês trufados”
• Cachorros X trufas
“É necessário ensinar o cão com muito amor. Existem dois tipos de criação: aquela no qual se deixa o cão com fome, sede, o que aguça os sentidos ou a que uso, que presume ser parceiro no animal. É necessário criar um vínculo e uma parceria tão forte com ele quando a que se cria com uma mulher. Quando o cão ainda é amamentado, passamos trufas brancas nas tetas da cadela para que ele se habitue ao aroma. Quando cresce um pouco, damos alguns pedaços misturados ao leite. Há quase um século a caça com porcos foi abandonada apesar deles terem um fato sensacional e nato, muito mais potente que o cão, porque era muito difícil evitar que aquele bicho imenso comesse as trufas quando as encontrava. Para evitar isso, os caçadores batiam na cabeça dos porcos com um pau. “
• Raças mais indicadas
“Hoje tenho oito cachorros, todos vira-latas. Qualquer um, desde que criado com carinho, é bom para a função. As únicas características fundamentais são não ser muito alto, porque o nariz fica longe demais do chão, e não correr demais porque é muito fácil “perder” a trilha da trufa. Uma caçada básica demora, no mínimo, três horas, então o cão precisa ter fôlego. Sempre que ele encontra uma trufa, dou um prêmio (biscoito canino); no segundo seguinte ele volta, automaticamente, à caça. Eles adoram e se divertem.”
Comente
Seja bem-vindo, sua opinião é importante. Comentários ofensivos serão reprovados