Finalmente São Paulo ganha uma loja dedicada aos queijos brasileiros, em sua maioria aqueles fabricados com leite cru: A Queijaria abriu as portas há uma semana, na Vila Madalena. São oferecidos, em média, 50 tipos (à base de leite de vaca e de cabra), feitos artesanalmente em Minas Gerais, interior de São Paulo, Pernambuco, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
É impossível falar na A Queijaria – que é um lugar que tanto o aroma quanto a visão da diversidade de nossa produção me causam ataques histérico/gastronômicos – sem reproduzir o texto de um post que fiz há uns meses. Vale a pena se inteirar e passar a valorizar algumas das poucas coisas que temos de louvável no país: nossa comida. Porque se nós não fizermos isso, o futuro será fondue de queijo prato sabor de plástico ou a eterna imitação de bries e gorgonzolas. E, pra mim, isso é um crime numa terra de tanta diversidade.
Nossas prateleiras e geladeiras estão cheias de parmesão, emmenthal, cheddar – um estrangeiro que der uma passada em nossos mercados e terá certeza de que apesar do nosso imenso rebanho bovino (e, decorrente disso, oferta de leite), só tivemos a capacidade de criar Catupiry, Queijo Minas Padrão e Requeijão. Mas o negócio não é bem assim.
Araxá, Campo Redondo, Serra da Canastra, Serro, Serrano, Salitre, Mandacaru: já ouviu falar de algum? Já comeu algum? Se você morar em Minas Gerais talvez, porque é a terra da maioria e o único estado no qual a venda é permitida. Se morar em outro estado do país, como eu, você é proibido de provar essas delícias 100% nacionais por conta de uma lei de 1952, que trata como contravenção a comercialização interestadual de queijos de leite cru (ou não pasteurizado), caso de todos eles, curados por menos de 60 dias. Ou seja: fabricou queijo de leite cru na Ilha de Marajó? Só pode comer no Pará…
Queijos de leite cru tendem a ter sabores mais complexos, curar de maneira mais rica. São melhores, enfim (ah, e vendemos produtos nas mesmas condições, provenientes de outros países, tá? Só pra você saber). Por outro lado, em 1998, o IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), declarou o processo de produção de queijo mineiro artesanal Patrimônio Histórico Imaterial Brasileiro. Ou seja: oficialmente é parte da nossa cultura a ser protegida, mas é proibido.Ê, Brasil.
Fernando Oliveira, da Alimento Sustentável e sócio da nova A Queijaria, viaja o país atrás de pessoas que fabriquem bons queijos, com alma. “Agora vou começar a trabalhar com um queijo de Serra da Conquista, feito na região de Caxambu, agridoce e salgado. O cara começou o laticínio em 1938. Para ter aceitação, batizou de parmesão. Porque essa síndrome de vira-lata? Temos que fortalecer as produções locais, os pequenos produtores, e ensinar o brasileiro a valorizar nossos bons produtos”, diz Fernando.
Dê um tempo no Grana Padano e prove a potência de um queijo pernambuco de cura longa. Deixe um pouco de lado o gouda e dê uma chance para um belo Canastra. Se o caso for preconceito, o coloque em pause. Não vai doer e é sempre ótimo expandir os horizontes – ou, nesse caso, olhar direito para o próprio quintal.
A Queijaria: R. Aspicuelta, 35, Vila Madalena, tel.: 99955-9091. Abre segunda à sábado, 10hs/19hs (sábado fecha 16hs).
Comente
Seja bem-vindo, sua opinião é importante. Comentários ofensivos serão reprovados