Se um escritor criasse um personagem baseado em Stephan Kawijian certamente não seria tão vibrante quanto o mesmo. Filho de armênios, criado no Líbano, já morou, entre outros países, na Síria e na Itália. Veio ao Brasil na década de 1990 para tentar um profissão bem diferente da que tem hoje: jogador de futebol. Assim que o sonho adolescente desmoronou, começou a cozinhar especialidades dos países de seus pais (e seus) para ganhar dinheiro. Pegou gosto – e jeito.
Com o tempo foi se profissionalizando, fazendo cursos (a mousse de chocolate que serve até hoje, soberba, é receita de Laurent Suaudeau), trabalhando como assistente em restaurantes, depois como chef, até que abriu a Sainte Marie. Até hoje, todos os dias, recebe os clientes com seu sorriso largo, simpatia tatuada na aura e um ‘mercizão’ sempre engatilhado – tanto seu vocabulário quanto a descrição dos pratos no menu tem a mistura divertida de francês, português e alguma terceira língua híbrida.
A rotisserie/restaurante de salão despojado, localizada na Vila Sônia, não pode ser caracterizada como armênia ou libanesa ou síria. Ela é tudo – o cliente escolhe o viés que preferir. Ou mistura tudo e sai mais feliz ainda. Mas a comida, qualquer seja a origem, é digna de salva de palmas.
A coalhada seca – servida como cortesia no couvert- é sedosa e belamente ácida. Para abrir a refeição vá de esfihas, de massa leve e bordas crocantes, divinamente temperadas com especiarias, caso da carne bovina que leva toque de canela (R$ 5,50), da de cordeiro com raspas de limão (R$ 9) e da de Basterma (R$ 8), carne curada e condimentos, como páprica doce, bem comum na Armênia. Caso goste da ótima basterma, peça a porção (R$ 20, a pequena; R$ 33, grande).
Se você for comer só um prato, recomendo de todo o coração a sensacional moussaka de cordeiro (R$ 45). Cheirosa, coberta por saboroso molho branco e queijo, traz camadas de berinjela gordinha intercaladas com carne macia e magistralmente temperada. Vale a pena ir de Perdizes até lá apenas por ela. Mas a Sainte Marie tem bem mais: kaftas, shawarma, michuis, saladas, parmegianas (!), vários pratos de peixes e frutos do mar. Menuzão para acompanhar o mercizão.
Outra beleza é o Quibe Montado (R$ 35). O negócio é o seguinte: quibe cru prensado e levado rapidamente a chapa; sobre ele, quibe assado; em cima, outra porção de quibe cru na chapa. Sobre tudo, a onipresente cebolas fritas, bem douradas. Negócio sério. E fiquei encantada com a delicadeza, equilíbrio e domínio do uso (de novo!) das especiarias na linguiça merguez artesanal, servida com as cebolas douradas. É bem servida e eu comeria inteira.
Não passe o dulcíssimo e bem bom doce de semolina com mel, amêndoas e limão confitado (R$ 10) e a esplendorosamente francesa e aerada mousse de chocolate (R$ 17). Porque, na real, quando come-se bem não é necessário fazer sentido. Ou, melhor: o sentido já existe …
Sainte Marie: Rua Dom João Batista da Costa, 70, Vila Sônia, tel: (11) 3501-7552
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