Jefferson Rueda acaba de trilhar o caminho contrário do sonho da maioria dos chefs: desencanou da sua primeira estrela Michelin – que conquistou este ano, à frente do elegante Attimo, na Vila Nova Conceição – para montar um bar, no Centro de São Paulo, em que pudesse ser 100% autoral (sem ter a quem dar satisfação a ninguém) e no qual trabalha mais de doze horas por dia, à vista da clientela, de segunda à segunda.
Trocou a cozinha essencialmente italiana que vinha executando desde o Pomodori por uma mistura de comida de roça – executada com habilidades de alta gastronomia – com toques asiáticos, especialmente coreanos e japoneses.
Deixou de lado os ingredientes louvados por foodies (trufas, ovas, carnes dry aged) para dedicar-se a um animal, ainda esnobado por boa parte dos brasileiros, e retirar de cada parte dele o que há de mais saboroso.
Passou anos pesquisando fornecedores que unissem bons tratos animais e excelência no produto final, até selecionar quatro – todos pequenos, do interior de São Paulo. Então, há duas semanas, Jefferson e Janaína Rueda abriram a Casa do Porco.
Instalado perto do Bar da Onça, a Casa do Porco tem uma das cozinhas mais interessantes da cidade, não só em sentido metafórico: dentro dela existem dois fornos a lenha no qual porcos desossados são assados inteiros (cerca de dois ao dia) e, após oito horas, se transformam no carro-chefe da casa, o Porco San Zé. De pele inacreditavelmente vitrificada e carne úmida, vem acompanhado por tutu de feijão, tartar de banana, couve e farofa (R$ 42 por pessoa).
Mas ali não é lugar para pular direto para os pratos principais. Algumas das criações mais interessantes e impactantes estão nos pequenos bocados, para comer com as mãos e compartilhar. Como o menu tem mais de quarenta itens, vá com com amigos, fome e tempo.
Prove a combinação improvável e espetacular dos retângulos de torresmo de barriga de porco pincelados com goiabada crocante (R$ 24); o saquinho com levíssimas pururucas com sala de especiaris, a porcopoca (R$ 10), os Croquetes de porco (R$ 20), a Linguiça de beterraba (R$ 24), a linguiça de sangue (R$ 24), a panelinha de Ovo frito com linguiça e tomates defumados (R$ 22).
Não deixe de perdir algum dos curados e defumados de pequenos produtores que incluem Presunto da Serra (Yaguara, PE, R$ 32), Speck (Salumeria Monte Belo,PR, R$ 21), Salame Dolce (Salumeria Italiana, MG, R$ 21), todos acompanhados por pão de casa, picles, mostarda com tucupi, compota de bacon e cebola caramelizada.
A tal influência asiática – o restaurante paulistano preferido do casal de cozinheiros é o coreano Bicol – mostra-se no delicioso bun (pão cozido no vapor) com barriga de porco, cebola roxa e pimenta fermentada (R$ 19), no untuoso Sushi de papada de porco com tucupi preto (R$ 29), na Costelinha de porco em cesta de alface romana com arroz e algas (R$ 19) e no Lámen de porco (R$ 49) de caldo tão, mas tão saboroso, que deixa no chinelo várias casas da Liberdade dedicadas a ele.
Para os que sentem saudades das massas de Jefferson, há Espaguete fresco com ragu de linguiça ou bolonhesa de porco (R$ 49, cada).
Para os comensais sem preconceito ou medinhos gastronômicos, a casa serve, por dia, duas cabeças de porco assadas e servidas com tutu, tartar de banana, couve e farofa. Custa R$ 220 e serve duas pessoas. É preciso reservar com antecedência.
Como se vê, os preços são justos. A conta pode ficar bem mais salgada caso você peça drinques – medianos – que custam entre R$ 29 e R$ 35.
Delicadas, femininas e equilibradas, as sobremesas da patissière Saiko Izawa (também ex-Attimo) finalizam a refeição com leveza, caso dos Morangos com fitas de salsão e sorbet de manjericão (R$ 22). Um dos melhores da cidade, o cremoso e denso Pudim de leite é finalizado com chantilly de caramelo e algodão doce (R$ 21).
Se não der tempo de entrar, compre os sandubas que são vendidos numa janela para rua: de porco assado (R$ 15), vegano (R$ 15) e vegetariano (R$ 15).
São Paulo ganhou um tremendo bar – e que permanece aberto o dia todo.
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