Ao entrar no Animus, não o prejulgue pelo climão genérico de restaurante moderno (cozinha à vista, paredes escuras, pouca cor na decoração, bar minuciosamente arrumado e garçons jovens e bonitos): a essência da casa comandada pela jovem chef Giovanna Grossi é o oposto de genérica.
O Animus une autoralidade, técnica impecável, criatividade utilizada com sabedoria e boa dose de ousadia: ali, não há divisão entre entradas, petiscos e pratos principais, uma vez que todas as receitas salgadas são servidas em pequenas porções pensadas para serem compartilhadas.
Esse modelo pode ser um tanto estranho/irritante para o público acostumado ao serviço padrão: confesso que as tigelinhas, cumbuquinhas e frigideirazinhas me incomodaram no começo da refeição, mas já nem passavam pela minha cabeça ao final dela. Basta se acostumar – e você irá, porque a comida é deliciosa.
Apesar de ter apenas 28 anos, Giovanna tem um currículo e tanto: foi vencedora das etapas brasileira e latino-americana do concurso mundial de gastronomia Bocuse D’Or e, desde o ano passado, tornou-se jurada da competição. Não é pouca coisa, ainda mais pelo fato de ser mulher: as instituições gastronômicas, especialmente as francesas, ainda são profundamente machistas.
É notória a formação de cozinha clássica francesa em seus pratos – o corte perfeito dos legumes, os cremes e caldos impecáveis, a forte presença de manteiga -, mas ela vai além disso, mesclando sabores tropicais e ingredientes brasileiros, criando uma assinatura bem particular. Exemplo claro disso é a salada de feijão manteiguinha com camarões em duas texturas (R$ 25): a pimenta, usada sem medo, e a acidez alegram o feijão que ganha roupagem quase de um vinagrete, finalizado com gordos camarões salteados e, as patas, fritas.
Mesmo sendo bem animal – se não há carne, há queijo ou ovo -, as porções trazem vegetais executados com primor, tanto em ponto de cozimento quanto em sabor. Entre as receitas que mais me agradaram está a crocante vagem assada com molho de mostarda, coulis de azeitona preta, castanha de caju caramelizada e queijo curado ralado finíssimo (R$ 12) e a tortinha de queijo com chutney de cebola, legumes e chips de batata doce (R$ 25).
Os peixes brilham no cardápio, seja na delicada e potente focaccia com lascas de Beijupirá defumado, salada de tomate e picles de cebola (R$ 22), no creme de abóbora assada com peixe do dia e demi glace com coentro (R$ 30) ou nas costelas de pacu fritas, acompanhadas por pesto de salsinha e emulsão de alho (R$ 22).
Na parte doce, são seis sugestões, entre as quais a mais pedida, a espuma de pudim com crocante de limão e calda de caramelo (R$ 12) que, para mim, é insuportavelmente doce. Muito mais equilibrado, o mousse de graviola envolve uma fina camada de creme de café e é ladeado por crocante de especiarias (R$ 15).
A refeição no Animus é para ser colorida, divertida, gregária. Mesmo precisando de duas ou três porções por pessoa para sair satisfeito, a conta não fica salgada: em um casal, com sobremesas e cafés, gastamos R$ 210.
Para quem quiser conhecer melhor a cozinha de Giovanna, o melhor é optar pelo menu degustação de oito etapas: ao valor de R$ 135/pessoa, tem um boníssimo custo-benefício (o vegetariano custa R$ 120).
Durante a semana, o menu-executivo custa R$ 58 e inclui ótimo pão com azeite temperado, uma “proteína”, como disse o garçom (qual o problema com a palavra carne, meodeos?!) e três porções do dia.
As pequenas porções criadas por Giovanna fazem do Animus um grande restaurante.
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