No mundo em que vivemos é raro parar e respirar profundamente. Respirar com tempo de sentir o ar entrar, percorrer seu caminho e sair. Respirar acalmando a mente. No mundo de hoje, é raro não nos sentirmos levemente deprimidos e constantemente pressionados a sermos mais eficientes, mais bonitos, mais magros, mais influentes, mais ricos. Eu, ansiosa de nascença, tenho uma dificuldade quase patológica em relaxar e apenas… estar. Viver o agora.
Ao observar o calmo e constante correr do rio Liucura, me dei conta de que ali, naquele momento, estava tranquila como há muito não me sentia. Não tinha um músculo tensionado, não pensava em nada do que poderia dar errado na vida, não ansiava por coisa alguma: apenas vivia o instante. Este foi o maior presente – de muitos – que os dias no Hotel Hacienda Vira Vira me trouxe: paz de espírito.
O que me acalmou no Vira Vira não foi apenas a paisagem deslumbrante da região de Pucón, no sul do Chile. Não foi apenas a majestosa presença dos picos nevados do vulcão Villarrica em todas as vezes que saía do meu quarto ou a reconfortante visão do rio e dos pássaros enquanto curtia a maciez da minha cama. O que me acalmou por ali foi o prazer de estar num local com alma.
Aberto há dois anos, o deslumbrante hotel de 18 quartos, que funciona dentro – e totalmente integrado – de uma fazenda de 22 hectares, é resultado do sonho de um ex-banqueiro suíço em criar um negócio sustentável, farm to table, que unisse a expertise europeia em hospitalidade à geração de empregos local e respeito pelo entorno.
Michael Paravicini procurou o terreno ideal para construir seu empreendimento em todo o Chile, mas foi mesmo aos pés do vulcão, à beira do rio e em meio a região dos indígenas Mapuche que o encontrou – e se encontrou. Mudou-se com toda a família para o país e dedicou-se completamente a tirar a ideia do Vira Vira do papel. Não só deu certo como é, sem sombra de dúvida, dos lugares mais especiais nos quais estive.
No quesito luxo é irrepreensível: quartos amplos de decorados com bom gosto indiscutível, staff altamente capacitado, serviço impecável. Contudo não é o luxo opressor do esbanjamento, das grifes, dos logotipos, dos dourados e brilhantes. O luxo ali tem a pegada contemporânea da palavra que foca muito mais na riqueza da experiência do que na aquisição. No ser e não no ter.
Mas o que torna o Vira Vira extremamente especial, para mim, é a gastronomia.
A comida começa muito antes do horário das refeições: começa no campo. O hotel possui nove vacas leiteiras, criadas soltas e alimentadas apenas com pasto. É com o leite delas que a equipe – sob a orientação de um mestre queijeiro suíço – produz toda manteiga, iogurte e diversos tipos de queijos consumidos pelos hóspedes. Essa preocupação com a origem do insumo já seria linda por si só, mas é fantástica quando se considera a qualidade altíssima do resultado final.
A produção local também engloba folhas e vegetais de bem cuidada horta orgânica, ovos, carne de frango e cordeiro. Os peixes são comprados, semanalmente, direto dos pescadores em Valdivia (distante quase duas horas de carro), respeitando a sazonalidade das espécies. Esse respeito a estação de cada produto – seja peixes, frutas ou verduras – cria algo maravilhoso: a mudança diária de menu.
O talentoso chef uruguaio Damian Fernandez – por oito anos responsável pela cozinha do La Bourgogne, em Punta del Este – prepara maravilhas regionais com apurada técnica francesa. O Vira Vira tem uma das melhores cozinhas de hotel do mundo, senão a melhor. E isso não é nenhum exagero.
Cozinha sazonal, local, limpa, que utiliza a totalidade dos ingredientes: são coisas assim que me emocionam na gastronomia. O cuidado com a procedência do alimento, com o solo, com quem trabalha nele – isso pra mim é milhares de vezes mais importante do que estrelas, taças de cristal, salão impecável. Isso faz TODA a diferença no sabor.
A experiência de hospedar-se no Vira Vira inclui toda sorte de atividades bacanas, não ‘apenas’ comer (que é, de longe, a que eu mais gosto hahahaha). O sistema all inclusive do hotel compreende também pescaria, rafting, passeios à cavalo e de bicicleta, esqui, visita às termas da região, yoga, trekking, montanhismo, aulas de culinária… Quer aprender mais sobre horta? Claro. Seu interesse é produção de queijo? Faça uma visita guiada à queijaria. Gosta mesmo é de vinho? Beleza, faça uma degustação. Aliás, bom dizer, a adega é farta, com bons rótulos (muitos chilenos, claro) à vontade: a bebida também faz parte do pacote.
Para mim, o conceito all inclusive do Vira Vira também incluiu paz de espírito.
Comente
Seja bem-vindo, sua opinião é importante. Comentários ofensivos serão reprovados