Ao caminhar pela primeira vez pelos longos, acarpetados e estreitos corredores do Orient Express, só conseguia pensar em Agatha Christie e em seus personagens misteriosos – não dava pra refrear o clichê mental, fazer o quê… James Bond, mulheres chiquérrimas e seus chapéus, paisagens acachapantes sucedendo-se pelas janelas e drinques em taças de cristal também invadiam minha mente. Então, ao chegar a minha cabine, Agatha e James sumiram e fui tomada por uma excitação tão imensa que escapuliu pela boca: “Nussasenhora, estou no Orient Express!”.
Há anos a Ásia, especialmente o sudeste, é meu destino de sonho. Não há gastronomia que mais me encante. Ano passado passei uns dias em Cingapura e essa paixão consolidou-se. Por isso não tive nem um lampejo de dúvida sobre onde passaria minhas férias neste ano: Tailândia. Durante a extensa pesquisa que faço sempre que escolho um destino, me deparei com o site do Orient Express e, confesso, arrepios subiram imediatamente pela minha coluna – era AQUILO que eu queria. Eu PRECISAVA viajar no trem mais famoso e elegante do mundo.
Entre os diversos roteiros existentes, o que parte de Cingapura, cruza o interior da Malásia e chega em Bangcoc me pegou de cheio: três dias imersa em arrozais, plantações de palmeira, matas, rios, vilarejos distantes. Três dias no Orient Express E no sudeste asiático. Perfeito.
A viagem começou assim que, semanas antes da partida, recebi em casa uma linda carteira de couro com os “Invitation to Board” e uma brochura repleta de informações e diretrizes essenciais. Por exemplo: para evitar que turistas avacalhem a experiência com papetes, regatas e meiões brancos até a canela, há algumas regras que achei bárbaras, como nada de calça jeans, bermudas ou tênis; os homens precisam vestir terno no jantar; é proibido ficar com o celular ligado nas áreas comuns. Porque é necessário preservar a elegância, afinal.
A sensação ao avistar o longo e belo trem pela primeira vez é parecida com ficar bem em um vestido: um misto de alegria incontida e antecipação das outras alegrias que virão quando ele for “inaugurado”. Ao chegarmos a estação de Cingapura ele estava ali, imponente, atraindo os olhares de todos – como atraiu no percurso todo, aliás. O Orient Express carrega muito mais que luxo. Carrega história, histórias passadas e que ainda serão escritas. Carrega um mito.
Dormi lindamente naquela noite, embalada pelo balanço macio do trem (e numa cama surpreendentemente aconchegante). Ao abrir os olhos e as cortinas, vi os campos da Malásia passarem por mim. Segundos depois, o chefe de cabine bateu delicamente à porta: hora do café da manhã. Sério, até um simples iogurte ganha status de iguaria servido naquela prataria! Pequenas coisas podem trazer grandes alegrias…
Pequenas coisas como um belo Negroni ao som de Sinatra tocado no piano do vagão-bar. Como ser chamada pelo nome por todo o staff ou nem precisar dizer se prefere água mineral com ou sem gás – o garçom já sabe. Como envolver-se em um roupão macio ou comer duas sobremesas.
Ah, sim, a comida. Sério, inacreditável o que um chef talentoso e uma equipe bem treinada podem preparar em cozinhas tão minúsculas e em constante movimento! Não houve um só prato mal executado, seja receitas francesas – o chef deste trem, Yannis Martineau, é francês – ou asiáticas. Os pães do couvert, sempre quentinhos. O timing entre as etapas, perfeito. A apresentação, impecável. Eu ansiava constantemente ir ao vagão-restaurante e checar o menu, ver o que me esperava na próxima hora de alegria.
Viajar no Orient Express é transportar-se para um mundo paralelo no qual tudo é belo, saboroso, eficiente, macio. É criar a sua história. É viver tranquilamente e em movimento.
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