“We are not sauerkraut” (Nós Não Somos Chucrute)! A frase bem humorada vem se tornando o lema dos novos chefs alemães, especialmente em Berlim. Como disse no outro post, as receitas alemãs que se espalharam pelo mundo foram especialmente aquelas mais pesadonas, de ingredientes baratos e facilmente encontráveis: joelho de porco, milanesas, picles.
Porém, hoje, Berlim e Munique (especialmente) vem passando por um processo de redescoberta dos produtos locais, uso de novas técnicas na cozinha e releitura da comida típica. A utilização de ingredientes orgânicos e sazonais é cada vez mais comum, de lanchonetes a fine dinings. O frescor está tomando o lugar das conservas. O movimento é muito parecido com o que aconteceu na Dinamarca e na Suécia e, aposto, em poucos anos Berlim será um destino gastronômico moderno e disputado.
Mas… tive só 48 horas em Berlim. Chorei. Sofri. Entretanto, pretendo voltar muito em breve porque consegui ter apenas um panorama muito superficial da já fervilhante vida gastronômica da capital alemã. Nestas 48 horas, fui guiada por profundos conhecedores da área e tentei misturar o tradicional e o novo. Se você passar por lá e, como eu, seu tempo for apertado, este post pode ser um bom norte.
Dois restaurantes novos que priorizam ingredientes da estação em preparações criativas, comfort e de alto grau de preciosismo, são o Katz Orange e Lokal, em Mitte. O primeiro fica num lindíssimo pátio interno de um prédio residencial, por isso é bom manter a voz baixa, e abre somente para jantar. Gente linda, jovem, vibrante, animada. No menu contemporâneo, Tartare de gado criado solto (uma raridade por lá) servido com salada de pão, tomate cereja, azeitonas, pinoli e salsa verde; cheesecake matador, montado sobre camada de bolachas artesnais, coberto por geleia de ruibarbo. E o bar… puts, que arquitetura e decoração bacanas.
O Lokal leva ao máximo o conceito de “trabalhar com ingredientes frescos”: o cardápio é alterado até quatro vezes por refeição. Acabou o peixe que chegou de manhã? Troca-se a receita e trabalha-se com o coelho orgânico. As framboesas parecem meio deprimidas? Hora de trabalhar com mirtilos. A criatividade do chef é colocada à prova a todo instante e pelo que provei, não está nem um pouco gasta: tenro fígado de coelho com ruibarbo e alho poró grelhados, acompanhados por coalhada; salada de cendrè com morangos, cenouras brancas, raiz forte e molho de amoras. Outro lugar charmosíssimo, despretensioso, tranquilo e, atenção, sem placa na porta.
Antes de falar dos pratos tradicionais, uma pausa para o Monsieur Vuong, o vietnamita mais famoso e querido pelos berlinenses. Não sem razão: preços camaradas (come-se muito bem com 30 reais), eterno clima de festa, comida repleta de frescor, bela execução. Eu fui de Pho Bo, a deliciosa sopa vietnamita de noodle de arroz com carne vermelha, muitas ervas e, toque do chef, anis estrelado e canela.
Agora, sim, tradição: apaixonei pela Flammekuchen, a pizza alemã. Massa finíssima e extremamente crocante, elas são feitas para partilhar enquanto se toma algumas (muitas!) cervejas. A mais consumida é a de bacon e cebola (ótima) mas confesso que cai de amores pela de salame, rúcula e molho de tomate da Standige Vertretung, rede de cervejarias com unidades em Berlim, Munique, Hanover, entre outras cidades alemãs. Se for no calor, sente-se numa das mesinhas à beira do Rio Spree, peça a Kolsch da casa e esqueça-se.
Agora, se você não for ao Curry 36, sinto dizer, mas não esteve em Berlim. As imensas filas já são a dica de como turistas e moradores amam o melhor currywurst de Berlim. Ah, sim: currywurst é um O prato é composto por linguiça de porco (que pode ser frita ou na chapa) cortada em pedaços, coberta por catchup e curry em pó, escoltada por batatas fritas. Parece simples – e é. E como toda comida simples, pode ser sensacional ou absolutamente olvidável. No caso do Curry 36, sensacional: linguiças artesanais de vários tipos, incluindo orgânica, generosamente cobertas pelo ótimo catchup da casa – que leva apenas um toque de curry saboroso- e acompanhadas por generosa porção de fritas sequinhas. Comeria umas dez…
Ah, ao lado, fica o famosérrimo- e sempre LOTADO- Mustafa’s, que prepara kebabs vegetarianos. Não deu pra provar… principalmente porque meu pouco tempo não combinava com as 50 ansiosas pessoas na fila.
Por falar em kebab, o doner kebab – carne preparada em espetos verticais (chamamos de ‘churrasco grego’), fatiada, colocada no pão com vegetais – é uma instituição em Berlim. Cinco motoristas de táxi afirmaram, com orgulho, que o prato foi criado na cidade por imigrantes turcos. Não sei se é verdade, mas o doner do Schlemmerbuffet Doner Kebab é um tesão: kebabs de frango ou boi, finamente fatiados, são colocados com todo o amor no meio do pão fofo (com textura de focaccia) de formato triangular e generosamente ornamentados com repolho, cenoura, cebola e tomate fresquíssimos e crocantes. A alegria custa 4 euros. Fiquei só babando nas pizzas – pois é! – preparadas na hora em forno a lenha.
Preciso, logo, passar mais 48 horas em Berlim. Em cada bairro, claro.
Comente
Seja bem-vindo, sua opinião é importante. Comentários ofensivos serão reprovados